O governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB) usou verba da tarifa
do metrô paulista para pagar obrigações contratuais com a operadora
privada da linha 4-amarela sem ter reembolsado o caixa do Metrô por
isso.
Essa "pedalada", que ocorreu desde o início comercial da linha, em 2011,
gerou um prejuízo de pelo menos R$ 332,7 milhões até 2014.
A dívida, no entanto, só foi reconhecida pela gestão Alckmin em acordo firmado com a empresa pública em outubro do ano passado.
Mas a negociação, no entanto, resultou em perdão da dívida, que teve que
ser absorvida pelo Metrô como prejuízo em meio à grave crise financeira
enfrentada pela empresa.
No contrato assinado em 2006 entre o governo do Estado e a ViaQuatro,
concessionária da linha 4, consta que a empresa terá prioridade no saque
dos valores arrecadados com a tarifa do transporte público.
Ficou definido também que a tarifa de remuneração paga concessionária
não é o valor da tarifa pública (hoje em R$ 3,80) que as empresas
públicas recebem -que incluem políticas de gratuidade e integração.
No relatório de administração do Metrô de 2013 já se reconhecia que essa
situação "gera impacto financeiro para as empresas públicas do sistema
metroferroviário", mas não havia estimativa de valores.
Naquele ano, por exemplo, enquanto a tarifa cobrada do usuário era de R$
3, a ViaQuatro recebia do governo R$ 3,13 por passageiro transportado
sem baldeação -em caso de transferência, o valor era a metade.
No ano seguinte, o balanço patrimonial do Metrô apresentou, no grupo de
contas a receber, um valor de R$ 332,7 milhões devido pelo governo do
Estado relativo à diferença entre a remuneração da ViaQuatro e o valor
da passagem.
O documento classificou esse crédito como "de liquidação duvidosa", ou
seja, difícil de ser recebido. Reconhecia-se ali que esse problema
gerava "menor arrecadação tarifária da Companhia do Metrô".
Em outubro de 2015, enfim Estado e Metrô celebraram acordo para resolver
a questão. Mas ao invés de receber os R$ 332,7 milhões, o Metrô,
controlado pelo governo, teve que lançar o montante como "perda da
companhia".
Tecnicamente de economia mista, a companhia na prática é controlada pelo Estado: 96% de seu capital pertence ao governo.
Além desse valor, o relatório do Metrô cita outros R$ 136,6 milhões
resultantes da continuidade da "pedalada" em 2015. Nem o acordo nem o
governo deixam claro se esse valor será pago e se a manobra continua.
Pelo documento, o governo apenas apenas reconheceu sua responsabilidade
na saúde financeira da empresa. Diz que será responsável pelo
"equacionamento dos efeitos suportados pelo Metrô, em face da regra de
rateio da receita tarifária do sistema metroferroviário, naquilo que
afetar a sustentabilidade econômico-financeira da companhia".
O rombo no caixa só agrava a situação de crise financeira do Metrô. No
ano passado, a gestão Alckmin deu um calote de R$ 66 milhões na empresa
em 2015, dinheiro que seria usado para cobrir os custos da política de
gratuidades. O menor repasse será mantido neste ano.
Sem receber os recursos devidos pelo Estado, a companhia estatal
paulista é forçada a cortar custos de operação e abrir mão de
investimentos e de melhorias no serviço que presta aos usuários e no
quadro de funcionários.
No mesmo ano que abriu mão de R$ 332,7 milhões, o Metrô investiu R$ 264
milhões em manutenção, o menor montante dos últimos anos e cerca de
metade dos R$ 524 milhões investidos em 2014.
Apesar da negativa do governo, as consequências para os usuários são claras.
Conforme a Folha revelou, a empresa já tem menor número de trens à
disposição, maior tempo de espera no horário de pico, e vem sendo
obrigada a retirar trens de operação para servir de "estoque" de peças.
OUTRO LADO
A Folha enviou uma série de questionamentos para a Secretaria dos
Transportes Metropolitanos e para o Metrô, mas, em uma semana, eles não
foram esclarecidos pelos órgãos.
Não foi esclarecido se a manobra usando a verba da tarifa para pagar as
obrigações contratuais com a ViaQuatro foram mantidas depois do acordo.
Tampouco se o Metrô será reembolsado pelos R$ 136,6 milhões perdidos em
2015 em razão da prioridade no saque da concessionária da linha 4.
A secretaria também não respondeu qual foi o valor das tarifas de
remuneração da ViaQuatro nos últimos três anos, nem qual o montante de
repasses à empresa.
O contrato da linha 4 prevê reajustes anuais para a concessionária,
independentemente da variação no preço da passagem -definida por
conveniência política.
Os órgãos afirmaram apenas que "não há prejuízo ao usuário do Metrô
tampouco na qualidade dos serviços oferecidos" e que "o governo tem todo
o interesse de que o Metrô prossiga obtendo resultados positivos em sua
operação".
O Metrô disse apenas que o "Estado poderá repassar, a seu critério, as
diferenças da arrecadação tarifária. O procedimento poderá ser adotado
em caso de problemas na sustentabilidade econômico-financeira da
companhia", com possibilidade de mantê-lo até o final da concessão da
linha 4, previsto em acordo entre as partes". Na Folha
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