Auditores fiscais do estado ingressaram com
ação acusando o governo de prejudicar o caixa do estado por meio de
operações de crédito com empresa fraudulenta
por Gabriel Valery, da RBA
publicado
02/09/2016 15:30
Guilherme Lara Campos/ A2 Fotografia
Alckmin e Villela: 'Governo está tentando adiantar uma receita de forma artificial', denuncia Sinafresp
São Paulo – Auditores fiscais do
estado de São Paulo entraram ontem (1º) no Ministério Público do Estado
de São Paulo com uma ação popular contra o governo de Geraldo Alckmin
(PSDB) por fraudes em operações de crédito. Se confirmados, os atos
configuram crime de responsabilidade, implicando rombo futuro no
patrimônio público para “maquiar” as contas, inflando o orçamento de
curto prazo do estado.
“Se confirmado, isso configura crime de
responsabilidade dos secretários e de quaisquer entes do governo que
tenham parte nisso. Agora, cabe ao Ministério Público analisar. Para
nós, as operações alteram o balanço, o orçamento do estado de forma
fraudulenta”, afirmou o vice-presidente do Sindicato dos Agentes Fiscais
de Rendas do Estado de São Paulo (Sinafresp), o auditor fiscal Gláucio
Honório.
Por esse esquema, o estado fornece créditos à
empresas, ele tem contas a receber de empresas inadimplentes, ou que
cometeram infrações. Esses valores a receber são divididos em lotes
preferenciais e não preferenciais. A fim de adiantar o recebimento, o
estado vende estes lotes para empresas financeiras ou bancos. As
preferenciais têm maior liquidez, ou seja, possuem menor risco de não
serem pagas, isso porque, de tempos em tempos, o estado promove
parcelamento dessas dívidas, perdoando multas ou juros.
O mercado realiza esse tipo de prática
corriqueiramente. O problema é quando as fraudes começam. Agrupar
dívidas e vendê-las a empresas terceiras foi uma prática utilizada em
larga escala com títulos podres do mercado imobiliário norte-americano, o
que desencadeou a crise de 2008. Em São Paulo, a gestão Alckmin pode
estar realizando fraudes que podem implicar graves danos futuros,
segundo o Sinafresp.
Os títulos podem ser vendidos para empresas privadas,
visando ao recebimento mais rápido dos valores. Aí começa a fraude, de
acordo com o sindicato. Alckmin criou uma empresa “mista” que compra
esses títulos de dívidas, a Companhia Paulista de Securitização (CPSEC),
que vem comprando os lotes não preferenciais nos últimos anos. São os
de mais alto risco. Não haveria problema, se esta empresa fosse privada.
Mas na prática, ela é uma sociedade anônima, com cerca de 3 milhões de
ações no mercado. Apenas três não são do estado, pertencem ao
ex-secretário da Fazenda Renato Villela e a mais dois funcionários do
alto escalão da pasta.
“Esta suposta empresa não é mista de fato. Ela é do
governo. Veja, o problema é que empresas públicas não quebram. Se houver
rombo, os cofres públicos vão cobrir. Isso fere a Lei de
Responsabilidade Fiscal”, explica Glauco. “Ele (Alckmin) está
tentando adiantar uma receita de forma artificial. Nos títulos de alto
risco, ele pega uma aplicação de longo prazo e a transforma em dinheiro
de curto prazo. Isso é um jogo de balanço que traz dinheiro fictício,
carregando riscos futuros para a saúde das contas públicas”, continua. O
objetivo seria inflar o orçamento do ano, maquiando os valores do
caixa, o que pode causar um rombo, uma bolha futura.
Posição do estado
Em nota, a Secretaria da Fazenda afirma que as
operações da CPSEC foram autorizadas pela Assembleia Legislativa, e que
de 2012 a 2015, a empresa acrescentou R$ 2,14 bilhões aos cofres do
estado. Entretanto, Glauco insiste que “existem muitas coisas para serem
explicadas”. Isso porque o valor citado pela secretaria possui
"inconsistência".
“Na nota do estado, eles dizem que a CPSEC trouxe R$ 2,14 bilhões. Todavia, o balanço da secretaria mostra debêntures (títulos)
na ordem de R$ 6 bilhões. Por que ele só trouxe R$ 2,14 bilhões?
Exatamente porque esta operação de crédito trouxe dinheiro, mas existe o
risco de parte das dívidas”, explica o auditor. “Outro problema é que o
projeto passou pelo Legislativo em 2009, e a primeira operação foi
realizada em 2012. Isso começou durante a gestão de José Serra (PSDB) e,
talvez, ele tivesse a noção de que isso não era totalmente legal”,
afirmou.
Queda de secretário
Na terça-feira, Alckmin anunciou a troca do comando
da pasta da Fazenda. Saiu Renato Villela (dono de pequena parte da
CPSEC, o que de acordo com o estado “justifica” o teor “misto” da
empresa), empossando Hélcio Tokeshi. Apesar de alegar “motivos
pessoais”, os auditores fiscais consideram que mobilizações da categoria
e denúncias – como a apresentada na RBA de problemas em relação ao ICMS – influenciaram na decisão.
“Villela tinha um viés contrario ao servidor público
de carreira. Ele sempre fez questão de deixar isso muito claro com suas
atitudes, como de não dialogar com a categoria. Com isso, ele criou um
verdadeiro caos na secretaria. Isso se refletiu na queda da arrecadação.
Ele dizia que a culpa era da crise, mas de acordo com índices, a
arrecadação caiu mais do que qualquer justificativa. Ele nunca admitiu,
mas a razão foi o mau direcionamento, má administração e trabalho
inadequado”, afirmou.
A ação no novo secretário segue uma incógnita, porém,
o Sinafresp projeta esperanças. “Nossa expectativa, mesmo sem conhecer o
novo secretário é de que ele tenha algum conhecimento do serviço
público”, disse Glauco. A intenção é de que a pasta atue de forma “mais
técnica e menos política”, disse. “Sabemos que a Fazenda sempre terá
algum viés político, mas que ele seja menor.”