Comissões Parlamentares de
Inquérito que não apresentam relatório final demonstram ‘submissão’ da
Assembleia Legislativa ao governo Alckmin, diz deputado petista
São Paulo – As Comissões Parlamentares de Inquérito
(CPI) da Assembleia Legislativa de São Paulo têm sido usadas pela base
do governador Geraldo Alckmin (PSDB) para impedir que investigações que
atinjam o governo sejam realizadas. De 15 CPIs iniciadas nesta
legislatura (2011-2015), apenas quatro foram concluídas. Seis comissões
foram encerradas sem relatório final – quatro destas nem elegeram
presidente – e uma foi suspensa pela Justiça. Das quatro que estão
ativas hoje (26), duas não tiveram sequer o presidente eleito e as duas
que têm coordenação realizaram poucas reuniões.
O líder do PT na Assembleia Legislativa, deputado
Luiz Cláudio Marcolino, vê isso como uma estratégia combinada entre o
governo Alckmin e sua base no legislativo. “Desde o primeiro dia da
legislatura, em 15 de março de 2011, a bancada do governo protocolou
diversos pedidos de CPI, com temas diversos. Alguns deles nem têm a ver
com a ação do legislativo. É justamente para trancar a pauta”, afirmou.
Com isso, outras investigações ficam travadas, como o
pedido de CPI para investigar os contratos e lucros dos pedágios nas
estradas paulistas, feito em outubro de 2011.
Dentre as comissões iniciadas nesta legislatura,
estão investigações para apurar “os problemas relacionados com o consumo
de gordura hidrogenada ou gordura trans, presentes principalmente nos
alimentos industrializados” e “investigar empresas de telemarketing, com
o objetivo de se evitar o abuso dessa prática ao consumidor de forma
constrangedora”.
Além de temáticas inusitadas, nenhuma delas
apresentou um relatório final ou mesmo elegeu presidente e acabaram
extintas por ato da presidência da Assembleia, em 12 de agosto do ano
passado, cinco meses após terem sido iniciadas.
No mesmo caminho, foram as CPIs dos Serviços Odontológicos e
da Pesca Predatória, extintas sem eleger presidente e sem conclusão, do
Parcelamento ‘sem juros’ e do Consumo Abusivo de Álcool, que elegeram
presidentes – Celino Cardoso e Cauê Macris, respectivamente, ambos do
PSDB – mas também acabaram sem apresentar relatório.
Até agora, também vão por esse caminho as CPIs
da Eletropaulo, iniciada em 15 de outubro de 2013, e da Compra e Venda
de Ingressos, de 15 de agosto do mesmo ano, que também não elegeram
presidentes.
“O objetivo é obstruir qualquer CPI que possa, de
fato, investigar algo no estado. O papel delas não é fazer nenhum tipo
de apuração”, acusou Marcolino.
O presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo, deputado Barros Munhoz (PSDB), não retornou o pedido de entrevista da RBA.
A assessoria de imprensa dele informou apenas que não cabe ao
presidente da Casa controlar os trabalhos de uma CPI e que se segue o
regimento interno: 32 assinaturas para acatar um requerimento e a CPI
entra na fila. Somente cinco comissões podem atuar ao mesmo tempo. Sobre
as que terminam sem relatório de conclusão: “isso deve ser explicado
pelos respectivos presidentes”.
Atualmente, somente duas comissões estão com
trabalhos em andamento. A CPI do Desaparecimento de Pessoas realizou
quatro reuniões desde 15 de agosto do ano passado, sob a presidência do
deputado José Bittencourt (PSD). Esta inclusive, é a única comissão não
presidida por um deputado tucano nesta legislatura. Mesmo assim, o PSD
faz parte da base de apoio de Alckmin.
Já a CPI da Violência Contra as Mulheres, realizou
apenas duas reuniões, sendo uma delas para eleger o presidente, o
deputado Fernando Capez (PSDB), e outra para definir a pauta dos
trabalhos, que não foi levada adiante. No último dia 18, a comissão
retomou os trabalhos prorrogando os trabalhos por mais 60 dias.
A RBA tentou contatar os deputados que presidem ou presidiram CPIs na Assembleia nesta legislatura, sem sucesso.
A comissão que analisaria a situação salarial de
médicos que trabalham para planos de saúde privados, criada em 23 de
março de 2011, foi suspensa por determinação da Justiça, em uma ação
movida pelo PT, que considerou o tema inadequado para apreciação de uma
CPI. “Este trabalho devia ser feito pela comissão temática adequada,
como relações de trabalho ou saúde”, explica Marcolino.
Já as investigações que apresentaram relatórios de
conclusão foram a CPI do Ensino Superior (7 de dezembro de 2011), a da
TV por Assinatura (6 de março de 2012), a da Reprodução Assistida (5 de
dezembro de 2012) e a da Cartelização do Mercado de Auto Peças (7 de
outubro de 2013). Todas elas também eram presididas por deputados
tucanos, o que demonstra o controle do partido do governador sobre as
investigações.
Assembleia tucana
A Assembleia Legislativa de São Paulo é composta por
96 deputados estaduais. Destes, somente 25 – 22 deputados petistas, dois
do PCdoB, um do Psol – se colocam como opositores ao governo de Geraldo
Alckmin. O que significa uma relação de 74% de apoio, contra 26% de
oposição. “Isso torna muito difícil conseguir as 32 assinaturas
necessárias para abrir uma CPI. E depois para organizar os trabalhos,
pois a maioria da comissão sempre vai ser governista”, explica
Marcolino.
Conseguir as assinaturas, por exemplo, é a atual
barreira à instalação da CPI para apurar a corrupção no Metrô e nos
trens paulistas. A
oposição conseguiu, até agora, 29 assinaturas para pedir a instalação
de uma CPI. Faltam quatro, que precisarão ser obtidas entre deputados
governistas. E este não é um problema da atual legislatura.
De acordo com o relatório final da CPI instalada para
investigar denúncias de fraudes em licitações para a construção de
casas pela Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), de
5 novembro de 2009, a oposição aos governos tucanos não conseguia
emplacar uma CPI havia uma década. “A CPI da CDHU foi a primeira CPI
instalada de todas as que foram requeridas pela oposição nestes últimos
10 anos”, diz um trecho do documento, cuja relatoria foi do deputado
Roberto Morais (PPS).
Porém, ela não conseguiu ser mais desenvolvida que
qualquer outra comissão nos últimos anos, como diz o próprio documento.
“O que se pode concluir é que a CDHU, assim como outros entes do governo
estadual, representa uma verdadeira caixa preta de onde pouco ou quase
nada se consegue extrair. A CPI da CDHU, infelizmente, mimetizou o
processo investigativo. Em outras palavras, fez de conta que investigou
para tentar, assim, atestar a idoneidade de irresponsáveis gestores
públicos em detrimento da defesa do erário”.
A presidência da comissão ficou a cargo do deputado
José Augusto (PSDB). O que contradiz uma premissa da casa – não
regimental – de que o autor do requerimento para instalação de uma CPI
fica responsável por conduzi-la. A investigação sobre a CDHU foi pedida
pelo hoje ex-deputado Mário Reali (PT).
No último dia 3, uma nova CPI foi aberta na
Assembleia, sob pedido da oposição. A apuração sobre as causas e as
responsabilidades pelo desmoronamento de 450 mil toneladas de lixo do
Aterro Pajoan, situado no município de Itaquaquecetuba, ocorrido em 25
de abril de 2011. O incidente interditou estradas e atingiu riachos que
desaguam no sistema de abastecimento do Vale do Paraíba. Ainda não houve
eleição do presidente e os trabalhos não têm data para começar. Mas, em
ano eleitoral, parece improvável uma mudança no padrão.
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