POR MATEUS COUTINHO-Estadão
21/04/2016, 05h00
Contabilidade da empresa referente a três grandes obras do governo de
São Paulo mostra pagamentos a empresas de fachada usadas para o
pagamento de propinas no esquema de corrupção na Petrobrás
Ao mapear as movimentações milionárias da Andrade Gutierrez com empresas
suspeitas de pagarem propinas a agentes públicos, incluindo companhias
de fachada, a Lava Jato se deparou com repasses da empreiteira
relacionados a três importantes obras do Governo de São Paulo para uma
firma de fachada utilizada por um operador de propinas no esquema de
corrupção da Petrobrás.
É a primeira vez que os investigadores conseguem mapear quanto as áreas
da empreiteira que cuidavam de cada obra dos mais variados setores em
todo o País repassaram para firmas de fachada, ampliando o leque das
investigações para além da Petrobrás. Ao todo, as contas contábeis da
Andrade e de consórcios dos quais ela participa ligados às obras da
Linha 2 – Verde do Metrô de São Paulo, ao Rodoanel Mário Covas e ao
Complexo Viário Jacú-Pêssego pagaram R$ 45 milhões entre março de 2008 e
setembro de 2010 para as empresas de fachada Legend Engenheiros
Associados e SP Terraplenagem.
As informações são do laudo 010/2016, elaborado pelos peritos Daniel
Paiva Scarparo, Audrey Jones de Souza e Ivan Roberto Pereira Pinto, no
dia 25 de fevereiro deste ano. O documento não faz nenhuma acusação ao
governo de São Paulo nem a agentes públicos envolvidos nas licitações do
Metrô e da Dersa, mas indica que um expediente utilizado para a lavagem
do dinheiro da propina na Petrobrás e também no setor elétrico –
pagamentos a firmas de fachada – pode ter se reproduzido no governo
paulista. A PF ainda não concluiu o rastreamento do dinheiro. Grande
parte dos valores recebidos por estas firmas de fachada eram repassado
para outras empresas de fachada ou sacado de forma fracionada para
evitar a identificação do destinatário final, o que dificulta o
rastreamento.
Jacú-Pêssego. O
consórcio SVM, do qual a Andrade faz parte, realizou quinze pagamentos
de setembro de 2009 a setembro de 2010 que somaram R$ 30,4 milhões à
empresa de fachada SP Terraplenagem. O Consórcio teve apenas um contrato
com a Dersa, para a execução das obras no Lote 1 do Complexo
Jacu-Pêssego, na capital paulista. O contrato foi firmado em junho de
2009, dois meses antes do primeiro repasse do SVM à empresa de fachada.
O empreendimento foi entregue em 17 de novembro de 2011, mais de um ano
após o último repasse do Consórcio para a SP Terraplenagem. Como
divulgou o próprio governo do Estado, o trecho custou R$ 93,1 milhões.
Metrô. Em
relação às obras do lote 8 da Linha 2 – Verde do Metrô de São Paulo,
subtrecho das estações Tamanduateí e Vila Prudente, foram dois
pagamentos do centro de custos da Andrade Gutierrez ligado ao
empreendimento para a Legend, que não teve funcionários entre 2006 e
2012. O primeiro pagamento foi no valor de R$ 7,05 milhões, que,
conforme indica a planilha, foram divididos em parcelas iniciadas em 20
de março de 2008 e concluídas em primeiro de junho de 2010, dois meses
antes da conclusão das obras.
O segundo pagamento, da ordem de R$ 7,3 milhões, foi concomitante com o
primeiro, sendo dividido em parcelas que começaram em 2 de junho de 2008
e foram até primeiro de fevereiro de 2010. Com isso, os dois repasses
ocorreram simultaneamente ao andamento das obras tocadas pela Andrade,
que começaram em dezembro de 2007 e foram concluídas em 21 de agosto de
2010. Segundo técnicos do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, o
custo da obra, na época, seria de cerca de R$ 351 milhões por Km,
incluindo gastos com trens e sistemas ferroviários, fazendo com que o
valor da obra total, de 4,3km chegasse à R$ 1,5 bilhão no período.
Além disso, o laudo da PF aponta que parte dos pagamentos para a Legend
ligados às obras da Linha 2 também passaram pela conta “overhead”, que
contabiliza os gastos da administração central da empresa em cada obra
e, segundo a PF indica o conhecimento da direção da companhia sobre as
operações com empresas de fachada.
Rodoanel. Já
em relação às obras do trecho sul do Rodoanel, foi realizado um
pagamento da conta da Andrade relacionada ao empreendimento em parcela
única de R$ 1,08 milhão em 14 de agosto de 2009.
O contrato com a empreiteira foi firmado em 2006, teve um aditivo em 2007 que levou a um desconto de 4% e um segundo aditivo em setembro de 2009, que levou a um acréscimo de 7,85% no valor do contrato um mês após o repasse da Andrade para a Legend. O trecho sul foi concluído em abril de 2010.
O contrato com a empreiteira foi firmado em 2006, teve um aditivo em 2007 que levou a um desconto de 4% e um segundo aditivo em setembro de 2009, que levou a um acréscimo de 7,85% no valor do contrato um mês após o repasse da Andrade para a Legend. O trecho sul foi concluído em abril de 2010.
Com 57 km de extensão e custo total previsto de R$ 5,03 bilhões na época
em que foi inaugurado, em 2010, o trecho sul liga Mauá, no ABC, à
Rodovia Régis Bittencourt e ao Trecho Oeste do anel viário, em Embu, na
Grande São Paulo.
A Legend e a SP Terraplenagem são ligadas ao grupo do operador de
propinas Adir Assad, já condenado pelo juiz Sérgio Moro a 9 anos e 10
meses de prisão por lavagem de dinheiro e associação criminosa ao
utilizar a Legend e outras firmas de fachada para operacionalizar o
pagamento de ao menos R$ 40 milhões em propinas no esquema de corrupção
na Petrobrás. Em depoimento ao juiz Moro, no ano passado, Assad admitiu
sua participação na Legend, empresa na qual chegou a figurar como sócio
de 2006 a 2009.
O empresário era conhecido pela promoção de shows e eventos no Brasil.
Assad trouxe a banda U2, a cantora Amy Winehouse e Beyonce para o País.
O nome dele também esteve envolvido em outros escândalos, sendo
investigado pela CPI do Cachoeira, no Congresso Nacional, como suposto
intermediário de propinas envolvendo a empreiteira Delta com o
Departamento Nacional de Infraestrutura e Transporte (Dnit).
A reportagem tentou contato com a defesa de Adir Assad, mas o advogado
não atendeu o celular. A Andrade Gutierrez informou que não iria
comentar o teor do laudo. Os executivos da empreiteira firmaram acordo
de delação premiada e revelaram em vários setores do governo federal,
além dos desvios identificados na Petrobrás.
COM A PALAVRA, A DERSA:
“A DERSA nunca manteve qualquer contrato com a Legend Associados. Nas
obras do Rodoanel, em 2009, a Andrade Gutierrez participava de consórcio
responsável pela execução do trecho sul. Este contrato, firmado em
2006, teve um primeiro aditivo em 25 de maio de 2007, o qual resultou
num desconto de 4% sobre o preço global, e um segundo aditivo em 23 de
setembro de 2009, o qual resultou num acréscimo de 7,85%. A análise dos
contratos é permanente. Além de possuir um Departamento de Auditoria
Interna, a DERSA, em 2012, reduziu de R$ 735 milhões para R$ 186 milhões
a autonomia estatutária da diretoria da empresa para assinatura de
contratos, sendo necessário que, acima desse montante, haja ratificação
do Conselho de Administração. No caso específico do trecho norte em
construção, cujas obras foram iniciadas em março de 2013, por meio de
licitação, uma empresa de auditoria independente foi contratada para
acompanhamento da evolução do empreendimento.
A
DERSA – Desenvolvimento Rodoviário S/A não mantém e nunca manteve
qualquer contrato com a SP Terraplenagem, empresa a qual se refere à
reportagem. Quanto ao Consórcio SVM, integrado pelas construtoras
Andrade Gutierrez e Serveng, a Companhia firmou um único contrato, em 15
de junho de 2009, para a execução das obras no Lote 1 do Complexo Jacu
Pêssego, na capital paulista. Em janeiro de 2011, primeiro ano do
Governo Alckmin, a obra estava cerca de 80% executada. O empreendimento
foi concluído e entregue ao tráfego de veículos em 17 de novembro de
2011.”
COM A PALAVRA, O METRÔ:
“O Metrô não possui, nunca teve contrato ou efetuou pagamentos à
empresa Legend Engenheiros Associados. A Andrade Gutierrez foi
responsável pelas obras do lote 8 da Linha 2-Verde, subtrecho das
estações Tamanduateí e Vila Prudente. As obras foram iniciadas em
dezembro de 2007 e concluídas em 21 de agosto de 2010, no governo
anterior. Atualmente, a empreiteira mantém contrato, como integrante de
consórcio, na Linha 5- Lilás para escavação entre as estações Adolfo
Pinheiro e Brooklin, incluindo a construção desta última, no valor total
de R$ 1,11 bilhão. Para a construção da Linha 17- Ouro, a Andrade
integra consórcio em três contratos. Dois deles para a construção de
três estações e pátio de manobras foram rescindidos unilateralmente,
sendo aplicadas multas de R$ 100 milhões. Um terceiro contrato para
construção da via, implantação de sistemas e trens encontra-se em
discussão judicial.”
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